Estados financiam poupança para manter alunos na escola |
Prêmios para incentivar alunos a permanecerem na escola ajuda mas não resolve evasão
Brasília vai resgatar um projeto que teve vida curta na década de 1990 para tentar diminuir um dos maiores problemas do ensino médio: a evasão escolar. A rede de ensino do Distrito Federal vai abrir poupanças em nome dos estudantes como forma de estimular a permanência deles na última etapa da educação básica. Modelo semelhante é utilizado por diferentes estados, como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás e Piauí, para manter os jovens estudando.
No caso do Distrito Federal, o desejo do secretário de Educação é depositar a cada mês, pelo menos, R$ 300 para cada aluno. Só quem não reprovar nenhuma série e concluir o ensino médio receberá o acumulado ao longo dos três anos. O projeto não é novo na capital. Foi criado por Cristovam Buarque à época em que foi governador, entre 1995 e 1998. A Poupança-Escola acabou por uma decisão política do governador eleito na sequência, Joaquim Roriz.
Segundo o secretário de Educação atual, Marcelo Aguiar, o programa foi um sucesso à época. As taxas de repetência caíram de 29% em 1994 para 16% em 1997. “O dinheiro pode ser usado como impulso para a vida profissional ou universitária. É um incentivo que cria condições para minimizar os grandes índices de evasão do ensino médio, que é nosso calcanhar de Aquiles”, afirma. Em Brasília, a evasão (quantidade de estudantes que abandona a escola e não volta mais) atingiu 6,2% em 2012.
Os valores, métodos de saque e tolerância com o desempenho do estudante variam em cada estado. Em Minas Gerais, onde o projeto se tornou estratégia permanente, a cada ano são depositados R$ 1 mil na conta do aluno. Para isso, ele precisa se inscrever no sistema, ser aprovado e participar de atividades de formação complementar (escolar, cultural, cidadã ou profissional). A cada participação em uma delas, o jovem acumula pontos, que precisam chegar a 70 no fim do ano. O dinheiro só pode ser sacado após a conclusão do ensino médio.
Segundo José Celso, gerente do Poupança Jovem em Minas Gerais, todo o processo é acompanhado por um orientador local. O programa começou em 2007 na cidade de Ribeirão das Neves. Hoje, já faz parte da realidade das escolas estaduais de Ibirité, Esmeraldas, Governador Valadares, Juiz de Fora, Sabará, Teófilo Otoni, Montes Claros e Pouso Alegre. Ao todo, já foram investidos R$ 400 milhões no programa e cerca de 110 mil alunos, beneficiados.
“Temos uma demanda enorme, mas não podemos atender por conta de recursos mesmo. E os resultados são excelentes. Apenas 5% dos participantes foram excluídos do programa ao longo desses anos”, conta Celso. A exclusão ocorre caso o estudante tenha mais de duas reprovações ou abandone a escola. Quem passa sem recuperação pode sacar R$ 100 a cada ano.
No Rio de Janeiro, o Renda Melhor Jovem começou em 2011, beneficiando 4 mil alunos de três municípios de famílias que já faziam parte de programa de transferência de renda estadual. A poupança varia de acordo com a série do estudante (de R$ 700 a R$ R$ 1,2 mil por ano) e o aluno pode sacar 30% do valor a cada ano, desde que não seja reprovado.
No Piauí, há 10 mil beneficiados pelo Programa de Incentivo Educacional - Mais Viver. O projeto, ainda em fase piloto, vai atender estudantes de 44 municípios que possuem o maior índice de pobreza. Os depósitos anuais variam de R$ 400 a R$ 600 e serão excluídos do programa caso sejam reprovados ou abandonem os estudos. Em Goiás, a poupança também beneficia os anos finais do ensino fundamental, mas apenas os alunos que conquistaram as melhores notas na Prova Goiás, avaliação estadual.
Só dinheiro não basta
Pesquisadores da área reconhecem a necessidade de incentivar o jovem a permanecer na escola. Mas temem que esse tipo de iniciativa não promova mudanças significativas no ambiente escolar. “Não sei se isso motivará os alunos a melhorarem. Certamente para os que já iam passar de ano e aprendem é positivo. Mas quem tem dificuldade não sabe por onde começar. O problema é a qualidade da escola. A única coisa aceitável na educação é que o aluno passe de ano aprendendo”, opina Ruben Klein, diretor da Associação Brasileira de Avaliação Educacional (Abave) e consultor da Cesgranrio.
Maria de Salete Silva, coordenadora do programa de educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), diz que os gestores precisam olhar para a situação de todos os adolescentes e não só os do ensino médio. Isso porque grande parte dos jovens de 15 a 17 anos, que deveria estar concluindo a educação básica, ainda está no ensino fundamental. “Precisamos de propostas para quem ainda está no fundamental também”, afirma.
Dados do Censo Escolar 2012 mostram que a distorção idade-série (quantos alunos estão atrasados em dois anos ou mais em relação ao ideal) chega a 31,1% no ensino médio. A aprovação dos estudantes nesta etapa não superou 79%. “As estratégias dos gestores têm de contemplar acesso, permanência, aprendizagem e conclusão”, pondera Salete. “A aprovação não atesta necessariamente a aprendizagem”, comenta a coordenadora do Unicef.
O secretário de Educação do DF concorda que a escola precisa se repensar. As escolas da capital passarão a se organizar por semestres, por exemplo. Os estudantes cursarão parte das matérias em um período e o restante no outro. Ele acredita que os professores estarão mais próximos dos alunos e poderão contribuir mais para o aprendizado de cada um. Os currículos também ganharão nova orientação.
“Estamos adotando diversas ações para o ensino médio. A poupança é um estímulo para que ele não troque a escola pelo mercado de trabalho”, diz Aguiar. A rede do DF possui 88 mil alunos este ano. O orçamento para o projeto precisa de aprovação, o que o secretário acredita que acontecerá ainda neste semestre. A experiência de Minas Gerais, segundo José Celso, mostra que o dinheiro se torna apenas o primeiro estímulo. “Eles percebem a importância da escola para o futuro depois”, garante o gerente.
Outros prêmios
Em outros estados, como Mato Grosso do Sul, Ceará e Pernambuco, a distribuição de prêmios (bolsas de estudo, tablets, notebooks) também é utilizada para incentivar a permanência e o bom desempenho do aluno na escola. Maria do pilar Lacerda, diretora da Fundação SM e ex-secretária de Educação Básica do Ministério da Educação, acredita que os gestores não devem ter “medo de inovar, em nenhum sentido, quando pensamos no ensino médio”.
“Uma bolsa sozinha não resolve o problema, mas é um estímulo. Continuo acreditando que a essência do programa Ensino Médio Inovador é um belo começo, pois flexibiliza o currículo e de alguma maneira cria um protagonismo juvenil. O aluno começa a pensar em seus sonhos, projetos e ter uma pequena reserva financeira para estimular uma vida universitária ou algum empreendimento é importante”, diz.
O temor dos especialistas é as bolsas se tornem “soluções únicas” para os problemas do ensino médio. Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, ressalta que a escola precisa fazer sentido. “Parece que agora a solução para todos os problemas é dar bolsa. O que precisamos é de uma educação de qualidade, que gere interesse no aluno e dê condições de ele ingressar na vida produtiva, aproximando o jovem com cultura, esporte. Não existe solução fácil”, analisa.
iG
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