John Kerry, o secretário de Estado dos Estados Unidos, já avisou: o presidente Barack Obama chegará nesta quarta-feira 20 ao Oriente Médio para “ouvir”.
Melhor ser realista, visto que Obama ouvirá mais do mesmo.
Em miúdos, não haverá paz entre Israel e os Territórios Palestinos.
A despeito do fato de o embaixador israelense nos EUA ter dito no fim de semana que Israel retomará as negociações de paz, isso é conversa fiada de diplomata.
Não por acaso, o premier conservador Benjamin Netanyahu teve a habilidade de colocar dois falcões em cargos-chave do novo gabinete, formado na sexta-feira 15.
Ambos integram a coalizão liderada por Netanyahu, Likud-Beitenu, que por apenas um punhado de votos venceu as legislativas realizadas dois meses atrás.
O provável chanceler responde pelo nome de Avigdor Lieberman (ele ainda tem de se livrar de acusações de quebra de confiança e fraude). Por sua vez, o ministro da Defesa, Moshe Ya’alon, substituiu Ehud Barak, do Partido Trabalhista.
Nenhum desses três homens acredita na chamada solução de dois Estados, o de Israel e o da Palestina, em ponto morto desde 2010.
Aquele que numerosos analistas políticos diziam ser o homem favorável a uma solução de dois Estados, Yair Lapid, da legenda centrista Yesh Atid (Existe um Futuro), ficou com o ministério das Finanças. Ex-jornalista televisivo, Lapid, de 49 anos, foi a grande surpresa das eleições, mas, pelo menos por ora, está mais interessado em resolver a crise econômica a afetar também Israel.
Ou será que ele queria mesmo era continuar sob os holofotes, agora no palco da política, e a paz com a Palestina nunca foi uma questão a lhe tirar o sono.
Vale acentuar que Lapid expôs seu discurso de política internacional em Ariel, um assentamento ilegal na Cisjordânia. E, além de ser contra uma divisão de Jerusalém, o líder de Existe um Futuro, disse, sempre durante a campanha: “Não creio que os árabes queiram a paz”.
Obama também não poderá, como sempre foi o caso, fazer nada contra a construção de novos assentamentos nos territórios ocupados.
De fato, Naftali Bennett, outro a surpreender nas legislativas, este da agremiação religiosa ultranacionalista Lar Judaico, propõe a anexação de 60% da Cisjordânia.
Naftali, como Lapid, também ficou com um ministério voltado para a economia doméstica, Comércio e Indústria. No entanto, o ministro da Habitação, Uri Ariel, do Lar Judaico, será o braço direito de Naftali em questões de assentamentos.
Ademais, Lieberman, o provável chanceler, é favorável à construção de novos assentamentos na Cisjordânia.
Por sua vez, Mahmud Abbas, o presidente da Autoridade Palestina, pisa sobre ovos. De saída, o Fatah, na Cisjordânia, e o Hamas, na Faixa de Gaza, continuam divididos.
E as negociações para a solução de dois Estados parecem, cada vez mais, um sonho inatingível. Enquanto isso, a colonização da Cisjordânia e o bloqueio de Gaza continuam.
Durante as eleições, o cientista político Magid Shihade, professor na Universidade de Birzeit, me disse em Ramallah: “A chamada solução de dois Estados nunca fez parte da ideologia e prática sionista”. O sionismo, emendou, é uma ideologia colonialista que não enxerga a igualdade com o povo nativo. E, apoiado pelo Ocidente, “o sionismo tem uma natureza militar racista”.
Gideon Levy, editorialista do diário israelense Haaretz, concorda com Shihade. Ele escreveu: “Israel é um dos países mais racistas do mundo, com paredes a separar territórios, uma política de apartheid; (Israel) trai os valores fundamentais do movimento de direitos civis que tornaram possível o milagre Obama”.
O presidente norte-americano deveria, ao invés de “ouvir”, agir. Mas o mais provável é Obama e Netanyahu continuem o diálogo de surdos.
Carta Capital
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