Quem anda pelas ruas do Rio de Janeiro tem a sensação de que o trânsito vive constantemente com sinal fechado. A qualquer hora do dia, é um passo de procissão para se deslocar de casa para o trabalho e vice-versa. Para avançar 10 quilômetros nas principais vias de acesso ao Centro da cidade, gasta-se em média uma hora e meia.
É um engata-marcha, sacoleja, pisa no freio, sacoleja, para e arranca de tirar a paciência dos seis milhões de passageiros dos ônibus do Rio, na peregrinação diária em rodovias nas quais pagar pedágio não significa pista livre.
O desconforto foi medido pelo DIA, que durante um mês percorreu as 10 principais vias de acesso ao Centro do Rio — entre elas, as seis rodovias com pedágio e usadas na ligação com a Região Metropolitana.
O trabalho rendeu o ‘Engarrafômetro’, o tempo que o carioca passa todas as manhãs e fins de tarde para ‘atravessar’ as estradas. O excesso de carros, vias ultrapassadas e falta de novas estradas fizeram a viagem do carioca triplicar o tempo nos últimos dez anos.
A Avenida Brasil, por onde passam 270 mil veículos por dia, é a campeã da lentidão. De Irajá, na Zona Norte, até o acesso da Perimetral gastam-se duas horas. No trecho, o fluxo de carros e caminhões é intenso das 5h às 21h e há engarrafamento até no fim de semana.
Quem vai pela Linha Vermelha em direção ao Centro passa o mesmo sufoco (só que sem a companhia dos caminhões). A segunda colocada no ranking do ‘Engarrafômetro’ recebe 155 mil veículos por dia. Para cruzá-la, é necessário amargar uma hora e 35 minutos (sem chuva ou acidente).
As rodovias Presidente Dutra e BR-101 disputam bem de perto o terceiro lugar. Seus usuários levam em média 1h10 e 1h para se mover por 10 quilômetros. Na Via Dutra, as novas marginais melhoram o trânsito, menos na hora do rush. Na BR-040, só com 55 minutos e muita paciência nos últimos 10 quilômetros.
A CONTA DO EMPACAMENTO
Os engarrafamentos que tanto angustiam os cariocas viraram ‘imposto’ e motivo para o aumento na tarifa dos ônibus. Para se ter uma ideia, toda carga entregue hoje na Região Metropolitana traz a TDA (Taxa de Difícil Acesso) e a TDE (Taxa de Difícil Entrega), que correspondem a até 15% do valor de cada frete. O ‘imposto do trânsito’ é justificado pelo custo extra na operação dos serviços de transporte de cargas.
Os empresários do transporte de passageiros do Rio também apontam prejuízos de R$ 9,3 bilhões por ano. As perdas incluem consumo excessivo de combustível, que ultrapassa os R$ 150 milhões por mês, e a utilização de veículos extras — 10% da frota ou 1.500 ônibus a mais nas ruas, com gasto de R$ 27 milhões por ano.
Quem paga a conta é o passageiro, uma vez que os custos contribuem para os aumentos no preço das passagens acima da inflação. Também são computados prejuízos ecológicos com a emissão de poluentes na atmosfera, que totalizam R$ 7 bilhões por ano.
O estudo realizado pelo professor Ronaldo Balassiano para O DIA apontou os prejuízos diários com engarrafamentos em cada via da Região Metropolitana. Os cálculos computaram horas trabalhadas perdidas no trânsito e combustível desperdiçado. Os valores são relativos a no máximo uma hora de engarrafamento nos horários de rush.
Avenida Brasil R$12 milhões, Via Dutra R$ 7,6 milhões, Linha Vermelha R$ 3,7 milhões, Linha Amarela R$ 3,4 milhões, Ponte Rio Niterói R$ 2 milhões, Washington Luís R$1,4 milhão
OITO HORAS DE ENGARRAFAMENTO POR DIA
O relógio marca 4h, início da maratona viária do almoxarife Rafael Martins (foto ao lado), 26 anos. Morador de Austin, Nova Iguaçu, ele enfrenta oito horas na viagem de ida e volta até o trabalho, na Barra. Rafael está entre os seis milhões de cariocas que, com doses extras de paciência, um pouco de sorte e muito sacrifício, tentam sobreviver ao caótico trânsito do Rio.
Para percorrer os 60 quilômetros entre Nova Iguaçu e Barra da Tijuca, Rafael aprendeu a conviver com engarrafamentos e ônibus lotados. “Faço esse trajeto há cinco anos e o trânsito só piora. Antes, chegava em duas horas, agora, quando levo três horas e meia, é festa, pois a viagem foi rápida”, diz Rafael, que gasta 176 horas por mês no trânsito — mesmo tempo do trabalho. “Acordo às 3h30 e durmo às 21h. O jeito é compensar com cochilos nos ônibus”, revela, com bom humor.
O Dia
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