quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Um muro alto incapaz de conter a vontade de ajudar

Os operários José Antônio dos Santos Cezar, 47, e Francisco de Souza Batista, 33, vão procurar novo emprego
Demitidos, operários do Maracanã não se arrependem de terem pulado estrutura para oferecer apoio aos índios vizinhos e dizem que, se preciso, fariam tudo de novo.


O muro de 1,7 metro que separa o Museu do Índio do canteiro de obras do Maracanã não foi suficiente. Demitidos após pularem a estrutura de concreto para participar de um protesto contra a demolição do prédio ocupado pelos indígenas, os operários Francisco de Souza Batista, 33, e José Antônio dos Santos Cezar, 47, não se dizem arrependidos. Retirantes nordestinos, eles afirmam que se identificaram com a causa pela própria história de vida. E, se fosse necessário, fariam tudo novamente.

“Todo mundo sabia o que acontecia do outro lado do muro. Ninguém me convidou. Fui porque quis. A gente dá o braço quando a pessoa precisa, né? Vi que os índios estavam em menor número para enfrentar o Choque (Batalhão de Polícia). Então, fui lá e pulei o muro para ajudar”, contou Francisco, que há 12 anos deixou Reriutaba, no Ceará, para ganhar a vida no Rio como carpinteiro. Por uma coincidência, o nome da cidade faz alusão aos índios Reriús, antigos habitantes da região.


Ele e o pedreiro José Antonio — que veio de Mamanguape (PB) — tinham o salário de R$ 1,3 mil na carteira. Com hora-extra, chegavam a tirar R$ 2 mil por mês. Demitidos no dia 14 pela Concrejato Serviços, os dois devem receber até amanhã a rescisão. Enquanto isso, esperam uma nova oportunidade de trabalho. “Sou contra o que estão fazendo com aqueles índios. Fui à manifestação no horário do almoço. Eu não estava errado não, moça....Vou arrumar outro serviço. Corro atrás e consigo, mas o que estão fazendo com aquele povo não é certo”,afirmou José Antônio, que estava há cinco meses no emprego.

Morador da Praia de Mauá, na região de Magé, ele terá que parar a construção da casa e também vai acumular as dívidas do parcelamento da moto: “Fiz uma coisa para o bem. Minha família me apoiou. Se os índios precisarem de mim, eu volto lá”.

A Concrejato informou que os dois funcionários não foram demitidos porque apoiaram a manifestação, mas porque pularam o muro “(...) inclusive uniformizados, expondo-os a acidentes e abandonando o local de trabalho durante o expediente sem solicitação de dispensa nem comunicado aos seus superiores”.


Vítimas da má distribuição
Indiferentes à história do prédio, alvo da disputa entre governo e indígenas, os dois funcionários demitidos deixam transparecer motivações semelhantes a dos índios para ajudá-los a lutar pela ocupação do espaço. É a distribuição desigual da terra que levou famílias como a de Francisco e José Antonio a deixar o Nordeste em busca de melhor sorte nos grandes centros.

“A agricultura lá na cidade (Reriutaba) não me dava condições de sobrevivência. Foi por isso que eu vim parar aqui. Sempre morei em comunidade no Rio, mas consigo ter uma vida ajeitadinha. Pago aluguel de R$ 500 e ajudo meus dois filhos”, afirmou Francisco, que mora em Rio das Pedras.  

O Dia

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