sexta-feira, 2 de março de 2012

Vinculação do piso dos professores à inflação é incabível


Secretarias precisam investir diretamente e melhor os 25% de seus orçamentos em Educação

Não deveria nem haver discussão. O piso nacional para professores deveria ser aplicado pelos governadores e prefeitos e a proposta, de alguns desses políticos, de que o aumento do piso seguisse somente a inflação, deve ser encarada como um desrespeito não só com alunos e professores, mas contra toda a sociedade brasileira.


A lei determina que o piso salarial dos professores siga o aumento que teve o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que é, desde 2007, o fundo que financia a Educação Básica no Brasil. Acontece que, por vários motivos, entre eles a diminuição do número de alunos matriculados em escolas públicas, o Fundeb aumentou mais de 22%. Já a inflação do período foi próxima a 6%.

É bom esclarecer ao leitor que a diminuição da quantidade de alunos matriculados em escolas públicas deve-se à mudança de nossa pirâmide etária (a cada ano o número médio de filhos por família diminui) e ao aumento de matrículas em escolas particulares de filhos da nova classe média.

É comum vermos os municípios e Estados darem um “jeitinho” de utilizar os 25% de Vinculação Constitucional da Educação, que os obriga a usar um quarto de seus orçamentos diretamente na área, para outros setores. Compram canetas, móveis, material de limpeza, café, açúcar, entre outras coisas, tudo como se fosse para a Educação e depois mandam para outras Secretarias.

Constroem prédios como se fossem da Educação e utilizam para outros fins. Uma cidade da Grande São Paulo construiu um prédio de 12 andares, por quase R$ 15 milhões, e colocou o nome de “Centro de Formação de Professores”. Com menos de 850 professores em toda sua rede municipal, se todo dia tivesse formação de professores, cada andar receberia confortavelmente 70 professores. Como as formações não acontecem todo dia, na verdade deixaram dois andares com salas para formação e utilizaram os outros 10 andares para colocar toda a burocracia da Secretaria de Educação. E isto tudo com os 25% da Educação, o que é vetado pela lei.

Em São Paulo, tivemos os CEUs (Centros Educacionais Unificados), que concordo serem excelentes instrumentos para conferir autoestima à população local e para as políticas de Cultura, Esporte e Lazer, mas em nada ajudam na Educação de seus alunos. Colocar milhares de pessoas dentro de uma mesma escola só dificulta a aplicação de estratégias pedagógicas. É óbvio que os CEUs foram uma maneira inteligente que a ex-prefeita Marta Suplicy encontrou para usar os 25% da Educação na realização de políticas públicas de outras áreas.

O desvio dos 25% da Educação é regra geral em Estados e municípios brasileiros. São pouquíssimas as exceções. E as práticas de prefeitos e municípios são cada vez mais difíceis de serem descobertas pelos tribunais de contas.

O fato é que um professor ganha, em média, 60% menos que um profissional com o mesmo tempo de escolaridade e em outra carreira. E isto tem que mudar, para dar melhores condições para a formação continuada (formação a toda hora, a todo o momento) dos professores que já estão nas redes de ensino e, melhor ainda, para atrair melhores talentos para a carreira.

A nossa Constituição de 1988 determinou que 6% do orçamento federal ficassem com o Legislativo, divididos entre Senado e Câmara de Deputados. De 1988 pra cá, o nosso Produto Interno Bruto (PIB) passou de US$ 330 bilhões para quase US$ 2,5 trilhões. É um aumento de mais de sete vezes, o que reflete no aumento do orçamento que vai direto para o Legislativo. Somam-se a isto a melhoria da capacidade de fiscalização e arrecadação do Brasil, os novos impostos e o decorrente aumento da carga tributária.

Nos municípios ocorre a mesma coisa. As Câmaras municipais recebem, de acordo com sua população, de 3,5% a 7% do orçamento do município para cobrir seus gastos. Com o aumento do PIB e da arrecadação dos impostos, a cada ano o orçamento real das Câmaras é maior. Cidades médias (de 300 a 500 mil habitantes) passam 5% do orçamento direto para as Câmaras. Em 1988, elas tinham 1 ou 2 assessores por vereador. Hoje chegam a ter mais de 10. Como o dinheiro do Legislativo precisa ser gasto até o último dia do ano para não ter de ser devolvido para o Executivo, os senadores, deputados e vereadores fazem de tudo para gastá-lo.

Isto é um problema grave, que inclusive distorce a representação nos Legislativos, dando uma supermáquina de campanha para cada legislador. É um dinheiro que poderia ser utilizado para financiar a Educação e para a garantia do cumprimento do piso nacional dos professores. Mas até agora não vi nenhuma caravana de prefeitos, de governadores, ou até mesmo da sociedade civil, pedindo ao Congresso Nacional para diminuir a vinculação de repasse orçamentário.
iG

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