A Reforma Estapafúrdia do Ensino Médio
Querem
professores de ensino médio generalistas como os do ensino do 1º ciclo
do Fundamental. O aluno esperará a faculdade para ter professores
especialistas. Será tarde demais!
A ideia que o Ministério da
Educação (MEC) tem para melhorar a educação brasileira é a extinção do
"professor de colégio". Nunca pensei que se chegaria nisso. É
fantástico: não havendo mais a figura do professor, tudo se resolve.
A reforma que o MEC propõe para o ensino médio se resume nisto: ficam
extintas as disciplinas tradicionais -português, história, física,
filosofia etc. Seus conteúdos devem ser diluídos em "áreas", criadas sem
respaldo epistemológico, mas apenas como reflexo do mal arrumado Enem.
A proposta foi tema de dois textos nesta seção no último sábado. Com
ela, o MEC atual repete o erro da ditadura militar. Pela Lei de
Diretrizes e Bases de 1971, foi feito algo parecido, tendo sido
necessário voltar atrás sete anos depois, quando foi constatado o
fracasso da reforma.
Como não nasci ontem, posso dizer quais as principais consequências da reforma atual proposta.
1) A primeira é gravíssima: desaparecendo a disciplina, desaparece a
figura do professor da escola média, ou seja, o tradicional professor de
colégio, uma vez que é pelo domínio de um conteúdo específico que ele
se caracteriza.
O professor do ensino médio será um generalista
igual ao professor do ensino das primeiras séries do ensino fundamental.
Ele poderá ser despejado dentro das tais áreas e, conforme o jogo de
forças interno a elas, descartado. Professor sem disciplina no âmbito do
colégio não é professor.
2) Não havendo mais a profissão de, por
exemplo, professor de física, de filosofia ou de história, para que
serviriam os cursos de licenciatura na universidade brasileira? Para
nada. Isso vai causar desprestígio ainda maior da carreira do magistério
e o fechamento das licenciaturas na universidade.
3) Não existindo mais disciplinas na escola média, queiram ou não, haverá um vácuo de três anos na vida do jovem.
As áreas não funcionarão de imediato (se é que algo assim possa
funcionar um dia!), como sempre ocorre nesses casos de mudanças
esdrúxulas. Haverá, então, o caos na escola: não se saberá que tipo de
professor deverá ficar com os alunos e, ao fim e ao cabo, teremos
rapidamente na universidade duas ou mais gerações com três anos a menos
de ensino.
4) Descaracterizada dessa maneira, a escola média irá se
configurar como um "lugar de espera". Será um tipo de playground para
adolescentes (!), que deverão ficar lá, "na bagunça" -provavelmente eles
próprios perceberão que não se sabe o que fazer com eles. A escola será
um lugar para segurar uma juventude que deverá esperar a universidade
para voltar a ter professor especialista!
A universidade, por sua
vez, terá de arcar com a tarefa de suprir o que se perdeu nesses três
anos. Obviamente, não conseguirá dar conta disso. O ensino universitário
sofrerá pressão no sentido de baixar seu nível, uma vez que a maioria
dos alunos não estará entendendo coisa alguma em sala de aula.
Tecnicamente, no jargão da sociologia da educação, trata-se aí de
"expropriação do saber" do professor, uma conhecida antessala para
arrocho salarial e contenção de despesa.
PAULO GHIRALDELLI JR., 55, é
filósofo, professor da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro) e autor de "As Lições de Paulo Freire" (Manole)
Nenhum comentário:
Postar um comentário