Edição da Revista de História, da Biblioteca Nacional, mostra como setores sociais, entre eles a grande imprensa, foram decisivos na derrubada de Goulart e na legitimação da ditadura |
A edição deste mês
da Revista de História, da Biblioteca Nacional, traz um especial discutindo a participação civil no golpe
contra o presidente eleito João Goulart, em abril de 1964. A
publicação reconstrói a memória do período demonstrando como
setores da classe média, religiosos, políticos, setores da
imprensa, empresariado e militares se uniram em uma ampla campanha
para derrubar o governo de Jango, sobretudo em reação contra as
reformas de base e à participação das classes populares na
política.
O dossiê trata de
temas voltados à compreensão da articulação do golpe e de seus
momentos iniciais. Não são objeto de discussão as
questões relativas a cassações de direitos políticos ou violações
de direitos humanos durante o regime. Uma das
questões discutidas é a definição de "ditadura militar" para o período,
ocultando o registro histórico da participação de empresários,
religiosos e imprensa, entre outros setores civis, que atuaram como
financiadores, apoiadores ou que foram beneficiários do regime.
A
publicação defende o uso da definição "ditadura
civil-militar" como forma mais apropriada de denominar o regime. Embora não traga fatos
novos, o dossiê tem importância no momento em que se discute
a memória recente do país, através da atuação da Comissão
Nacional da Verdade.
De acordo com a editora da revista, Vivi Fernandes de Lima, o momento é oportuno para a publicação, que contribuirá
para o acesso a essa história por diversas pessoas. “Este
tema é pedido pelos leitores há anos e acredito que a revista deve
contribuir bastante não apenas para a formação de historiadores,
mas principalmente para a de estudantes da educação básica”,
diz.
A
revista trata dos temas de forma pouco comum à cobertura da imprensa
tradicional e mostra como essa mesma imprensa atuou ativamente na articulação do golpe e na desestabilização do governo
Goulart. E demonstra a participação dos dois principais
jornais paulistanos, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo, na campanha para derrubada do presidente João
Goulart e de legitimação do regime autoritário que se instalou depois, através de sua manchetes e editoriais.
Entre
os temas tratados, estão o início do levante militar em Minas
Gerais, a negativa de Goulart de atacar os golpistas, a atuação de
políticos e ministros na organização do golpe, o apoio de setores
da sociedade — como o de parte da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil por meio das Marchas da Família
com Deus pela Liberdade — e a importância de tratar do tema de
forma clara nas escolas de educação básica, por meio dos livros
didáticos e outras publicações.
Entre os especialistas que
contribuíram na produção estão o professor de história
contemporânea da Universidade Federal Fluminense Daniel Aarão Reis,
o pesquisador Luiz Antonio Dias, o professor Mateus Henrique de Faria
Pereira e o professor Jorge Ferreira, biógrafo de João Goulart.
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