Há um limite ético que o eleitor não aceita ultrapassar: o PT ganhou quando derrotou Maluf, mas, aliado a ele, agora se acabou |
O homem, depois que atravessa um rio, ao chegar na outra margem, não é
mais o mesmo, assim como o rio. Essa é a lei da dialética num mundo em
constante transformação, como dizia Heráclito, na Grécia. De lá pra cá,
pouca coisa mudou, com o novo sempre ocupando o lugar do velho. Nas
eleições de 2012 em São Paulo havia um pré-candidato novo, com boas
chances de mudar a cidade, apresentando novos ideais e métodos para
governar. Foi o que escrevi neste canto do Brasil 247, em 10 de setembro de 2011.
Assisti a dois encontros do candidato Haddad para discutir a
Habitação e Saúde com as bases do partido, e parecia que ele poderia
trazer de volta às ruas a aguerrida militância gratuita e os
intelectuais. Agora, quase um ano depois, volto para me desculpar com
meus leitores e com os eleitores. Alguns não conheciam aquele colega
professor por mim louvado, candidato que seria ungido por Lula e logo
adotado pelo PT e sua malcheirosa coligação a Prefeito de São Paulo. O
fruto de boa safra estava podre. O candidato novo ficou velho antes da
hora, e se vendeu ao diabo para juntar os cacos do tempo da televisão. A
luta é difícil, mas, sem ética, o filósofo marxista não pode ganhar a
eleição e, segundo a famosa XI tese, transformar o mundo. O povo não é
bobo, e Lula não é Santo para sozinho eleger o prefeito, na base de “os
fins justificam os meios”.
Luiza Erundina (1989/92), em nome da mudança e da ética, sucedeu
Jânio Quadros (1984/87) e derrotou Paulo Maluf, João Leiva e o José
Serra. Era o PT socialista que virou a casaca e tentou fazer um governo
popular em São Paulo. Porém, tudo o que conseguiu foi ser medíocre, sem
deixar nenhuma grande obra. Todavia, Erundina ainda mora na mesma casa
simples de anos atrás. Maluf, que a sucedeu (1993/96), acabou as obras
de Jânio e guardou dinheiro lá fora – contudo, está impedido de sair do
Brasil. A Interpol está na sua cola, com prisão decretada nos Estados
Unidos.
Enquanto isso, o PT, que era símbolo da moralidade, de lá para cá
entrou na corrupção, haja vista o seu julgamento atual no “mensalão”,
que deflagrou a possibilidade de levar à cadeia o presidente do Partido
no período daquela eleição, além de parte do governo Lula: o tesoureiro,
o operador, o “chefe da quadrilha”, ex-ministros, deputados, alguns
laranjas e peixinhos. Hoje em dia mostra sua evolução e malufou! É a
prova cabal de que é preciso mudar para continuar como antes. O slogan
diz tudo, e se desmancha no ar: “Um homem novo para um tempo novo”.
Perde o voto dos idosos, das mulheres, dos gays e a companheira de
chapa.
Erundina, certa da luta de classe, pulou da canoa furada do burguês
que acha que apenas rio possui margens esquerda e direita. Quanto ao
Lula, com a voz apagada, sem ouvir a das ruas, perde o carisma ao
assumir publicamente o tradicional estilo populista. Aquela foto do
beija mão, com o pupilo Haddad entre os mestres Lula e Maluf, na casa do
filhote da ditadura, é autofágica. Parece coisa de Machiavel: é a
negação da negação vendida como santíssima trindade.
O PT vive igual crise de identidade nas eleições municipais pelo
Brasil afora. Partido de massa, já completou seu ciclo. Nasceu e se
acaba em São Paulo. Haverá de surgir um novo partido que una pessoas de
princípios semelhantes no combate aos projetos políticos antagônicos.
Até lá, consagra o experiente José Serra como o bom administrador de São
Paulo para voltar e continuar suas obras. Ou ainda, em vez de café
requentado, o eleitor paulistano pode contar com o mais novo Chalita.
Vamos dar uma lição nessa malta e mostrar que não se vende o voto nem a
alma. Ao Rei Lula tudo, menos a nossa honra. Fora o novo Maluf e o velho
PT de guerra.
Jornalista e geólogo, Everaldo Gonçalves foi professor da USP, da UFMG e presidente da CPFL
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