Certas notícias são apresentadas como novidade, mas na verdade são
muito velhas, repetitivas e redundantes. Por exemplo, anuncia-se agora
que um conjunto de 40 relatórios encadernados, mantido em sigilo por
mais de três décadas, detalha a destruição de aproximadamente 19,4 mil
documentos secretos produzidos ao longo da ditadura militar (1964-1985)
pelo extinto SNI (Serviço Nacional de Informações). Ora, todos sabem há
muito tempo que os documentos importantes sobre a luta armada foram
todos destruídos, não há novidade alguma.
As ordens de destruição, agora liberadas à consulta pelo Arquivo
Nacional de Brasília, partiram do comando do SNI e foram cumpridas no
segundo semestre de 1981, no governo de João Baptista Figueiredo
(1979-1985). Algumas dessas ordens foram assinadas pelo general Newton
Cruz, que foi chefe da agência central do SNI entre 1978 e 1983.
Em recente entrevista à Folha, Cruz, que está com 87 anos, disse que
não se recorda de detalhes das destruições. Mas afirmou ter “cumprido a
lei da época”.
Do material destruído, o SNI guardou apenas um resumo, de uma ou duas
linhas, que ajuda a entender o que foi eliminado. Entre os documentos,
estavam relatórios sobre personalidades famosas, como o ex-governador do
Rio Leonel Brizola (1922-2004), o arcebispo católico dom Helder Câmara
(1909-1999), o poeta e compositor Vinicius de Moraes (1913-1980) e o
poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999), ambos diplomatas.
Reportagem da Folha mostra que alguns papéis podiam causar incômodo
aos militares, como um relatório intitulado “Tráfico de Influência de
Parente do Presidente da República”. O material era relacionado ao
ex-presidente Emílio Garrastazu Médici, que governou de 1969 a 1974.
Outros documentos destruídos descreviam supostas “contas bancárias no
exterior” do ex-governador de São Paulo Adhemar de Barros ou a
“infiltração de subversivos no Banco do Brasil”, o que certamente se
referia ao famoso “Bom Burguês”, chamado Jorge Medeiros Valle, que
trabalhava na agência Leblon do Banco do Brasil e, usando de artifícios
contábeis, levava vida de milionário, tinha três carros e desviou cerca
de dois milhões de dólares para a guerrilha que enfrentava a ditadura.
Sua vida era tão conhecida que virou filme, em 1979, dirigido por
Oswaldo Caldeira e com roteiro de Doc Comparato.
Boa parte dos documentos eliminados trata de guerrilheiros mortos até
1981. A análise dos registros sugere que o SNI procurava se livrar de
todos os dados de pessoas mortas, talvez por considerar que não mais
interessavam às atividades de vigilância da ditadura.
Carlos Newton Tribuna
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