Artigo do jornalista Oscar Pilagallo, que escreveu a história dos meios de comunicação de São Paulo, revela que jornais se transformaram em trincheiras contra Getúlio |
Desde que o deputado Fernando Ferro (PT-PE) criou a
expressão “PIG – Partido da Imprensa Golpista”, inspirado numa
declaração de Barack Obama sobre o canal Fox News, e o jornalista Paulo
Henrique a amplificou, vários veículos de comunicação – inclusive o 247 –
são frequentemente questionados por seus leitores. Afinal, são PIGs ou
não? A reação veio com a sigla “JEG – Jornalistas da Esgotosfera
Governista”.
No nosso caso, alegamos que é possível existir fora das
órbitas PIG ou JEG. Mas o fato concreto é que, diante de governos
trabalhistas, como de Getúlio Vargas e Lula, parte da imprensa toma
posições contrárias. É o que demonstra, neste 9 de julho, data dos 80
anos da revolução frustrada de São Paulo, o jornalista Oscar Pilagallo,
em interessante artigo na Folha de S.Paulo sobre o comportamento dos
jornais paulistas, em 1932. Foram precursores do PIG?
A imprensa paulista fardada de 1932
Ela ignorou a superioridade das forças
federais, fez campanha. Exceção, um jornal pró-Getúlio foi até
destruído. Com a derrota de SP, jornalistas foram presos.
Se nas guerras a primeira vítima costuma ser a verdade, na Revolução de 1932 não foi diferente.
O que foi diferente, isto sim, foi seu algoz. Em geral, a verdade
sucumbe diante do conflito de versões dificilmente verificáveis pela
imprensa. No caso da chamada Revolução Constitucionalista, no entanto,
foi da própria imprensa que partiram os disparos que atingiram a
verdade.
Não se trata da verdade abstrata, que resulta de convicções, de uma
visão de mundo, de um entendimento particular sobre o lugar que São
Paulo deveria ocupar naquela nova fase da República.
Trata-se, apenas, da verdade factual. Mal dado o primeiro tiro, em 9
de julho, as manchetes já tratavam o movimento como vitorioso, e com
pouca variação mantiveram o mesmo tom até quase a derrota final, em
outubro.
Nesse período, os jornais paulistas abriram mão de fazer jornalismo.
Durante os três meses que duraram os combates, optaram por privilegiar
uma campanha para elevar o moral da população e, sobretudo, das tropas.
Pouco interessava a informação objetiva da superioridade das forças
federais, o fato incontestável de que tinham mais armas e eram mais bem
treinadas.
No início, as conquistas pontuais dos soldados de São Paulo foram
superestimadas. Mais tarde, os avanços das forças inimigas seriam
minimizados.
Não é difícil entender por que a imprensa paulista agia assim. Se os
jornais escolheram mobilizar em vez de informar, é porque haviam vestido
farda bem antes da deflagração do conflito.
A revolução foi, em larga medida, articulada na sede do jornal mais
importante da cidade na época, "O Estado de S. Paulo", então com mais de
meio século de existência.
Toda a imprensa paulista, no entanto, logo aderiu à causa. O "Diário
de S. Paulo" e o "Diário da Noite", ambos de Assis Chateaubriand, "A
Gazeta", de Cásper Líbero, e a "Folha da Manhã" e a "Folha da Noite"
(que em 1960 seriam fundidos na Folha de S.Paulo), todos eles se
transformaram em trincheira.
Houve, efetivamente, um efêmero "Jornal das Trincheiras", com
propaganda mais aberta, mas a diferença em relação aos demais jornais
era mais de grau do que de natureza.
Também por um breve período circulou "O Separatista", cuja razão de
ser estava expressa no próprio título. Embora não contasse com o endosso
da maioria da imprensa, a ideia representava uma dissidência tolerada.
O que os jornais não podiam era ser contra São Paulo. Um jornal
tenentista, que apoiava o governante então provisório, Getúlio Vargas,
teve sua sede destruída pouco antes do 9 de julho.
O esforço jornalístico de guerra contou com a participação especial
do rádio. Como veículo de comunicação de massa, o rádio é contemporâneo
da Revolução de 32. Nasceu na Record, que embalava o suposto noticiário
com uma marcha militar, a "Paris Belfort".
Não havia espaço para isenção. A imprensa paulista não apenas
refletia os anseios da sociedade local. Também os insuflava, criando um
círculo vicioso. Derrotadas as forças de São Paulo, jornalistas e donos
de jornais foram presos e exilados. Do ponto de vista da história da
imprensa, porém, a grande vítima foi a verdade.
OSCAR PILAGALLO 247
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