“Dog’s Bônus” seria o nome correto.
Trata-se da idéia de que você pode dar um petisco para o cão, toda vez
que ele faz o que lhe foi ordenado, reforçando seu comportamento
positivo.
Nenhuma pessoa que tem cachorro e
convive mesmo com ele, usa esse método. Para circo, talvez esse
procedimento tenha alguma utilidade. Mas, para quem quer o cão sabido,
amigo e em casa, esse procedimento é inútil. Antes o amor e a atenção -
que o treino via façanha-e-recompensa, condicionador - é o que sabemos
que efetivamente funciona.
Em política educacional, alguns ainda
não chegaram a essa conclusão. Estão pensando na base do “Dog’s Bônus”.
Desacreditam completamente nas relações de “ombreamento horizontal e
amoroso”, nas quais Paulo Freire apostava, e se agarram a procedimentos
das Teorias de Administração de Empresas. Basicamente, duas: a de Taylor
e a de Relações Humanas no Trabalho.
Friedrick Taylor, um engenheiro da
Filadélfia, estudou tempos em relação a movimentos e encontrou pontos
ditos ótimos sobre eventos. Montou o que denominou de “linha de
produção”, ela própria com velocidade cada vez mais decidida por si
mesmo e não por cada indivíduo a ela integrado na fábrica ou empresa.
Com a entrada da máquina, ficou mais fácil fazer isso. Em empresas em
que a máquina não entrou como o carro-chefe, então, a alternativa foi
reforçar a disciplina: relógio e punição. Isso deu certo, a produção
cresceu. Mas outros acharam que poderia crescer mais ainda.
Esses outros colocaram sobre o
taylorismo uma idéia simples: ao invés da punição aos fracassados, que
tal eliminá-los de vez e, paralelamente a isso, premiar com pequenas
recompensas os que tiverem sucesso? Para fazer isso, é claro, tiveram de
criar um ambiente de camaradagem maior na linha de produção. Nas
empresas sem máquinas, onde o problema é sempre maior, introduziram
então a eliminação dos “não adaptados” e o prêmio com estardalhaço para
os “integrados”. Foi por aí que, no interior do taylorismo lambuzado
pela Teoria das Relações Humanas no Trabalho, nasceu isso que chamo de
“Dog’s Bônus”. Todo empregado de uma empresa sem máquinas – eis aí a
escola – deve receber um brinde, caso consiga promover a camaradagem no
ambiente de trabalho e, assim, fazer a si mesmo um cumpridor do
taylorismo, agora camuflado, além de tornar outros também capazes da
mesma coisa. Houve empresa que só se salvou de crises por conta dessa
brilhante idéia.
Todavia, o que nunca vi, em nenhum país
do mundo, foi esse procedimento dar certo para a instituição chamada
escola. Nem para a escola pública, tratada como instituição, nem para a
escola privada, tratada como empresa.
Posso ter, com tal procedimento, uma
escola que consegue que todos os seus alunos se alfabetizem em um ano?
Duvido. Ora, mas a minha geração (sou de 1957) ia para a escola e todos
da classe se alfabetizavam completamente em um ano. A minha escola era
administrada não por qualquer teoria especial, mas apenas com o bom
senso de professores que, enfim, conseguiam fazer o que tinham de fazer.
Eles mantinham uma rígida hierarquia vertical entre direção, eles
mesmos, funcionários e alunos, quanto a aspectos organizacionais, mas no
trabalho pedagógico sobre cada aluno eles utilizavam de um procedimento
coletivo, bem semelhante ao que esperaríamos do “ombreamento horizontal
amoroso”. Dois professores (ou mais) podiam se unir em função do
aprendizado de um aluno, criando assim uma horizontalidade triangular,
de modo que esse aluno, que estava ficando para trás no aprendizado,
acompanhasse a turma.
Qual o incentivo desses professores para
trabalhar assim? Incentivo “extra”? Nenhum! Ora, então o que estou
advogando é a velha teoria do magistério por sacerdócio? De modo algum.
Esses professores cumpriam seus trabalhos porque eles haviam aprendido,
na Escola Normal em nível médio, a fazer direito o que tinham de fazer.
Eles eram alfabetizados e alfabetizavam bem. Como eram gratificados?
Como todos: tinham salários que os colocavam na classe média e, por isso
mesmo, nenhum deles precisava ficar pulando cordinha e balançando
rabinho para o “Dog”s Bônus”.
Paulo Ghiraldelli Jr., filósofo, escritor e professor da UFRRJ, lança agora em junho As lições de Paulo Freire – filosofia, educação e política, editora Manole
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