É inacreditável que isso esteja acontecendo, mas é verdade. A CPI do
Cachoeira pode encerrar os trabalhos a partir de agora, porque não fará a
menor diferença. De repente, o corporativismo político falou mais alto,
a sem-vergonhice e a falta de caráter prevaleceram, e a Comissão livrou
governadores e parlamentares da quebra dos sigilos bancário, fiscal e
telefônico e de serem convocados a explicar suas relações com o
empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
A empreiteira Delta, apontada pela Polícia Federal como braço
financeiro do esquema, também não terá seus sigilos quebrados
nacionalmente, “por falta de indícios”, no entendimento da maioria da
comissão. A CPI livrou ainda da investigação o presidente licenciado da
empreiteira, Fernando Cavendish.
Para disfarçar (como se isso fosse possível…), os deputados e
senadores aprovaram apenas a quebra do sigilo da empresa Delta na região
Centro-Oeste, além dos sigilos de pessoas sem foro privilegiado que
assessoravam Cachoeira e já foram investigadas pela Polícia Federal.
Segundo os repórteres José Ernesto Credendio e Andreza Matais, da
Folha, a votação foi orquestrada pelo PT e PMDB, que comandam a CPI, e
contou com ajuda da oposição. O relator, deputado Odair Cunha (PT-MG),
sequer colocou em votação os requerimentos acerca dos governadores e da
Delta nacionalmente. Esses requerimentos só devem constar na pauta da
CPI no dia 5 de junho.
“Nós não vamos fazer devassa”, afirmou o deputado Cândido Vaccarezza
(PT-SP). “A generalização cheira a devassa”, complementou o deputado
Paulo Teixeira (PT-SP), como se isso explicasse a omissão da CPI.
UM GRANDE ACORDO, UMA VERGONHA AINDA MAIOR!
Foi feito um acordão entre caciques do PT, PMDB e PSDB para poupar os
governadores Marconi Perillo (PSDB-GO), Agnelo Queiroz (PT-DF) e Sérgio
Cabral (PMDB-RJ). No pacote dos governistas entrou ainda a preservação
da Delta nacionalmente, que tem obras com o governo federal.
“Reuniu-se um grupo numa sala e decidiram quem vai morrer. O Rio de
Janeiro está enterrado até a alma. O que vamos dizer?”, afirmou a
senadora Kátia Abreu (PSD-TO). “Na minha opinião, estamos convocando os
bagrinhos da história. Os importantes estão de fora”, complementou.
“Dá impressão de estarem selecionando alvos por orientação
político-partidária”, criticou o senador Álvaro Dias (PSDB-PR). “É um
mau começo desta CPI”, disse o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), um
dos poucos a insistir na convocação dos governadores. “Estamos
amarelando”, afirmou o senador Pedro Taques (PDT-MT).
DELTA DE FORA
O que provocou maior vexame foi a decisão do comando da CPI de não
quebrar os sigilos da Delta em todo o país. O relator e parlamentares do
PT e PMDB afirmaram que não existem indícios contra a atuação da
empresa em todo o país, o que gerou protestos.
“Estamos passando vergonha aqui. A Delta recebeu mais de R$ 4 bilhões
do governo federal e não vamos quebrar o sigilo da empresa? Como vamos
explicar isso ao Brasil?”, afirmou o deputado Fernando Francischini
(PSDB-PR).
“É a CPI do conta-gotas. O dinheiro do Centro-Oeste vai para a
central da empresa”, afirmou o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR).
“Em relação à Delta não existem apenas indícios, existem provas”, disse
o senador Álvaro Dias, em referência a vários diálogos interceptados
pela PF que citam a empresa. Apesar das críticas, a oposição ajudou a
aprovar o requerimento de quebra do sigilo apenas da Delta Centro Oeste.
CONVENCER UMA CRIANÇA…
Segundo a Folha, o relator e deputados do PT e PMDB se esforçaram
para negar um acordão para poupar alguns das investigações. “Não vamos
resumir nossos trabalhos em apenas uma reunião”, disse Odair Cunha. “Eu
não participei de acordão nenhum. Temos que ter serenidade”, disse o
deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
“Vossa excelência não consegue convencer a uma criança de três anos
que essa Delta não tem que ter seu sigilo aberto em todo país”, rebateu o
deputado Silvio Costa (PTB-AL), em resposta ao relator.
A votação desta quinta-feira praticamente sepulta a CPI. As
investigações devem ficar restritas ao que já foi apurado pela Polícia
Federal sobre os membros do grupo de Cachoeira sem avançar para os
pontos não apurados pela PF, até o momento, por envolverem políticos,
que têm direito ao foro privilegiado. A PF também não investigou a Delta
porque seu trabalho era voltado para Cachoeira, vejam só a que ponto
chegamos.
Carlos Newton Tribuna
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